Jejum: o banquete é Jesus

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“Isto é o que significa o jejum: um coração faminto por Deus”. Esta é uma das ratificações que John Piper dá à prática do jejum, em seu livro “Fome por Deus

Seguindo nesta trilha, queremos demonstrar, a partir da análise de alguns textos bíblicos, um correto entendimento da prática do jejum. De antemão, queremos defender que o jejum é uma boa obra oferecida a Deus voluntariamente, de forma autêntica, abstendo-se de alimento até que o corpo seja afligido, com o objetivo de ter uma comunhão com Deus mais profunda, e demonstrando sua grande expectativa pela restauração de todas as coisas.

Para mostrar o porquê desta afirmação acima, pretendo mostrar primeiramente o entendimento do jejum na antiga aliança, e a mudança de significado ocorrida quanto a esta prática.

1) O jejum na antiga aliança

A única ordem expressa (mas nem tanto assim) de Deus para que o seu povo jejue está em Levítico 23.26-32. Na proclamação do Dia da Expiação, o Senhor diz a Moisés:

“Façam uma reunião sagrada e humilhem-se, e apresentem ao Senhor uma oferta preparada no fogo. Não realizem trabalho algum nesse dia, porque é o Dia da Expiação, quando se faz propiciação por vocês perante o Senhor, o Deus de vocês”.

O imperativo “humilhem-se”, que também pode ser traduzido como “afligir a alma”, foi cumprido pelo povo de Deus através do jejum. Tanto foi assim, que o Dia da Expiação passou a ser chamado de Dia do Jejum, como em Jeremias 36.6. Nessa festa sagrada, o povo era convidado a, através do jejum, humilhar-se e a afligir a sua alma com o intento de buscar o favor de Deus para o perdão dos pecados.

Deste modo, a prática do jejum estava relacionada à tristeza pelos pecados com vistas ao favor de Deus pelo perdão. Foi neste sentido que jejuou Neemias, por exemplo:

“E eles me responderam: ‘Aqueles que sobreviveram ao cativeiro e estão lá na província passam por grande sofrimento e humilhação. O muro de Jerusalém foi derrubado, e suas portas foram destruídas pelo fogo’. Quando ouvi essas coisas, sentei-me e chorei. Passei dias lamentando-me, jejuando e orando ao Deus dos céus” Nm.1.3-4.

O jejum era um tempo separado para o luto pelo pecado, para a súplica e a intercessão para que Deus se dispusesse a perdoar os pecados individuais ou da nação e voltasse a olhar com misericórdia para o seu povo: “quando estavam doentes, usei vestes de lamento, humilhei-me com jejum e recolhi-me em oração” – Sl.35.6.

Por este motivo, inclusive, os discípulos de Jesus não jejuavam. Veja o que dizem a Jesus:

“Os discípulos de João jejuam e oram frequentemente, bem como os discípulos dos fariseus; mas os teus vivem comendo e bebendo” (Lc.5.33).

E Jesus respondeu o motivo:

“Podem vocês fazer os convidados do noivo jejuar enquanto o noivo está com eles? Mas virão dias quando o noivo lhes será tirado; naqueles dias jejuarão” (Lc.5.33-34).

O entendimento de Jesus a respeito do jejum era esse do AT. Um jejum de tristeza e humilhação. No entanto, esse jejum perdia completamente o sentido haja visto que o Deus para quem dedicavam o jejum estava ali, entre eles, comendo com eles. Era dia de festa, dia de banquete.

Observe que Jesus não aboliu o jejum. Ele apenas afirmou que, enquanto Ele estivesse com os discípulos, não havia motivos para isto. Tanto é que, na sequência, ele afirma: “Mas virão dias quando o noivo lhes será tirado; naqueles dias jejuarão”. Veja que Jesus sabe que haverá tristeza com a morte de Jesus e considera que jejuemos quando ele não estiver mais, fisicamente, entre nós.

Na sequência, Jesus nos conta uma parábola contrapondo o remendo de uma roupa nova em uma roupa velha, e vinho novo em vasilha de couro velha. Ali, Jesus está apontando para os novos significados que as festas e toda a religião judaica estavam recebendo. Tudo estava se fazendo novo. Inclusive o sentido do jejum.

Não haveria mais necessidade de um Dia de Jejum e Expiação. Nem haveria mais motivo para lamento e tristeza pela busca do favor de Deus. Deus já havia respondido todos os jejuns anteriores com a vinda de Jesus; e Jesus, com sua morte e ressurreição, havia pagado a dívida de todos os pecados. Por isso, o jejum terá uma renovação de significado.

2) O jejum na nova aliança

Veja que nós defendemos que o jejum mudou o seu significado, mas não mudou o seu procedimento. O jejum continua sendo uma abstenção de alimento com o fim de afligir a alma. Não existe jejum que não maltrate, de alguma maneira, nosso corpo; que não altere nosso semblante. O jejum nos aflige. Nós nos deixamos ser afligidos pela fome para mostrar a Deus que há algo muito mais essencial à alma que o alimento, que é a presença de Deus.

a) Jejum para comunhão e expectativa do retorno de Jesus

Quanto ao novo significado do jejum, podemos começar pelo próprio texto já trabalhado: “Virão dias quando o noivo lhes será tirado; naqueles dias jejuarão” (Lc.5.34).

Veja que Jesus está mostrando que seus discípulos jejuarão. Eles jejuarão pois Jesus não estará mais presente fisicamente entre eles. Deste modo, esse texto nos mostra que o jejum é um modo de manifestarmos nosso profundo desejo de comunhão com o Senhor Jesus. O jejum é um modo de mostrarmos que estamos com uma grande expectativa para que finalmente Jesus seja dado de volta ao seu povo. Esse não é um jejum de tristeza, como no AT. É uma busca por Deus. O modo continua, o propósito foi alterado.

b) Jejum como “obra de justiça”

O texto de Mateus 6.16-18 também nos traz luz a respeito dessa prática. Para começar, neste sermão de Jesus, Ele inclui o jejum junto de uma série de “obras de justiça”, como a oração e a esmola.

Veja o versículo 6.1: “Tenham o cuidado de não praticar suas ‘obras de justiça’ diante dos outros para serem vistos por eles”. Nesse texto, jejum é encarado por Jesus como uma obra de justiça, que não deve deixar de ser feito, mas sim ser feito da maneira certa.

Veja também como começa o vs. 16: “Quando jejuarem”. Jesus não está dizendo: “Se jejuarem”, mas ele está levando em consideração que seus discípulos certamente irão jejuar.

Não existe um dia certo para o jejum, nem uma rotina que deve ser praticada, assim como não existe uma rotina para as esmolas, por exemplo. O jejum deve ser voluntário. No entanto, tanto o jejum quanto a oração e as esmolas são obras que sucedem àquele que nasceu de novo em Cristo Jesus.

c) Propósito correto

O texto continua:

“Quando jejuarem, não mostrem uma aparência triste como os hipócritas, pois eles mudam a aparência do rosto a fim de que os outros vejam que eles estão jejuando. Eu digo verdadeiramente que eles já receberam sua plena recompensa. Ao jejuar, arrume o cabelo e lave o rosto, para que não pareça aos outros que você está jejuando” Mt.6.16-17

Nesse texto, Jesus não está dando regras de procedimento do jejum (cabelo arrumado, rosto lavado, no seu quarto) nem estabelecendo proibições (não conte a ninguém). Jesus está nos precavendo de nos tornarmos como os hipócritas, que jejuam para buscar a aprovação humana. Veja o que Ele diz: “eles já receberam sua plena recompensa”. Nós não jejuamos para buscar a aprovação humana. É sobre isso que Jesus está falando, sobre termos o propósito correto.

Mas veja um detalhe importante: Jesus não desconsidera o fato de que podemos ter nossa aparência física alterada, pois ele entendia o jejum como algo que aflige alma e transforma o semblante.

Se a aprovação humana não é o propósito correto, qual é, então, nesse texto, o propósito do jejum?

d) A recompensa do jejum

Veja que não é errado fazer jejum esperando uma recompensa. A recompensa certamente virá. Mas qual? É esta: “seu Pai, que vê em secreto, o recompensará”.

Veja que os hipócritas buscam como recompensa para o jejum a aprovação do homens; os filhos de Deus, por outro lado, buscam a aprovação de Deus. É essa a recompensa do jejum. Ser visto por Deus. Ter comunhão com ele. Ter a oportunidade de mostrar a Ele que não nos importamos com mais nada, seja o alimento, seja a aprovação dos homens, que não a aprovação de Deus. É essa a recompensa.

Minha opinião particular é que não é correto fazer jejum buscando qualquer outro tipo de recompensa. Pelo mesmo motivo de que é errado desejar ardentemente qualquer outra coisa que não seja a presença de Jesus. No mesmo capítulo, vemos: “Não se preocupem com sua própria vida, quanto ao que comer ou beber; nem com seu próprio corpo, quanto ao que vestir (…) os pagãos é que correm atrás dessas coisas” Mt.6.25.32.

Quando jejuamos para pedir qualquer coisa que não seja a comunhão com Deus, o Reino de Deus e sua Justiça, erramos, pois Jesus ordenou: “Busquem, pois, em primeiro lugar o Reino de Deus e a sua justiça, e todas essas coisas serão acrescentadas a vocês” (v.33).

A única ambição que deve promover nosso jejum é o nosso desejo ardente de ser encontrado aprovado por Deus, e ter plena comunhão com ele.

3) A prática do jejum no Novo Testamento

O Jejum tanto não foi abolido, como foi muito praticado pela igreja. O próprio Jesus jejuou antes de iniciar o ministério (Mt.4.2); os presbíteros de Antioquia jejuaram antes e para enviarem Saulo e Barnabé (At.13.2-3); Paulo e Barnabé jejuaram para ordenar presbíteros (At.14.23); Paulo jejuava com frequência (2Co.11.27).

Assim, o jejum é uma prática cristã que agrada a Deus quando feita pelo fiel que deseja ardentemente demonstrar o seu amor pelo seu Senhor.

Leia também:

Fome por Deus, de John Piper

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